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Jasmim #11 - Um Anel que Ficou

Jasmim #11

- Que ódio! O que é que eu fiz pra merecer esse irmão idiota?

É cedo da manhã. Quase ninguém caminha por esses lados de Volgogrado a essa hora. Só uma garota de blusa verde e calça preta, falando sozinha. Anna.

- E a mãe e o pai ainda defendem! Que ódio! Ele pensa que é o dono da casa! A TV, o sofá, tudo! E ainda fica com piadinha...

Ao dobrar a esquina, entre terrenos com árvores e poucos prédios, avista a loja aberta e Jasmim na porta, impaciente.

- Jasmim! O que houve?

- Outro sonho. Cuide do antiquário.

- Mas...

- Quando voltar eu conto. - E sai carregando a caixa pela rua.


Mais um anel. Dessa vez um anel que ela já viu. E pior, na loja da Anastasia. Aquele estúpido anel de prata, que a dona até chegou a lhe oferecer. "Combina com tudo..."

Ela que queria nunca mais precisar voltar... E com que cara vai olhar para Anastasia e dizer: "quero levar aquele anel de prata"?

- Que mundo louco, né? Você soube que lá perto de cemitério o povo está se mudando? É, que mundo louco... - É o taxista gordinho e bigodudo. Às vezes alguns taxistas gostam de conversar. Jasmim às vezes tem a sorte de achar um desses.

Mas ela permanece em silêncio, pensativa. Com uma camisa preta escrita em relevo e em azul "Unicorn", com estilo de letra rebuscado e de ar medieval. O cabelo preso e em seu colo a caixa com a morningstar.

- É, moça... Esse mundo tá estranho demais... Sabe que outro dia um passageiro disse que viu um lobisomem morto na calçada... Vê se pode! Um lobisomem... E o Isaac, colega da gente, que diz que foi mordido por um vampiro...

As casas passam do seu lado. Estranho... Não dá pra saber se foi a forma como ela vê o mundo que se modificou, mas tudo parece um tanto diferente do que sempre foi. Muitas pessoas nas ruas têm um olhar e comportamento estranhos. De uma forma sutil.

- Tem visto o noticiário? É, você tem cara de ser uma moça instruída, deve ter visto sim. Quem diria, né? China e Japão em guerra de novo, só pra variar... Espero que não inventem de colocar a gente no meio.

Jasmim continua olhando pela janela. Não vê a hora de chegar na loja pra tentar levar o maldito anel. E o que vai dizer exatamente? Anastasia vai querer vender? Provavelmente vende, mas vai tentar se vingar no preço.

- Está vendo uma fumaça ali no céu?

O taxista chama a atenção para uma fumaça que se dispersa pelo ar, não deve vir de muito longe.

- Sabe? Tenho uma filha da sua idade. Ela faz Biologia. Todo dia tem uma história nova pra contar... Olha, parece que o incêndio é no antiquário que você queria ir...

A fumaça sobe densa da loja de Anastasia, bem mais adiante na rua por onde vão.

- Maldição!


É cedo da noite. Jasmim já jantou e sentada em sua cama pensa em tudo o que passou no dia.

Os policiais vieram interrogá-la durante a tarde. Foi como soube que a dona e a filha morreram no incêndio e que a grade da porta dos fundos estava cortada ao meio. Do mesmo jeito que o ferrolho da sua janela estava quando houve o incêndio na sua casa dias atrás.

Parece claro que se trata de uma mesma pessoa nos dois casos, mas a polícia é estranha: "estamos tendo muito incidente em museus. Não dá pra dizer muita coisa. Estamos investigando."

Não restam dúvidas a Jasmim de que mais alguém está recebendo as mesmas informações que ela tem recebido através de sonhos. Ficou claro agora: foi em busca da morningstar que invadiram seu antiquário. E agora, seja quem for, conseguiu levar o anel de prata. Só não tem tanta raiva assim por nem fazer idéia de pra quê exatamente ele serve.

Seus dedos passeiam pela bola de aço com pontas e ao deslizarem para o cabo Jasmim percebe símbolos. Dois símbolos, um acima do outro, os dois próximos à bola.

O primeiro lembra o símbolo de Apollo, deus grego. Um círculo com um ponto no centro. O segundo lhe lembra o Olho de Hórus. O que um símbolo grego e um egípcio fazem num mesmo objeto? Claro que podem significar outra coisa...

Estavam lá antes? Provavelmente não, pois Jasmim simplesmente não se lembra deles. E quem lida com antiguidades desenvolve uma atenção especial para símbolos.

Mas decifrar estes símbolos não importa agora. O que preocupa Jasmim é mais alguém saber dos seus sonhos. Alguém que tem seus próprios truques e está movendo as próprias pedras. O jogo está seguindo.

Mas já é tarde. Jasmim se deita e se cobre, sem se afastar da morningstar, na esperança de ter finalmente uma boa noite de sono.


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